04/02/2025

O GOL DE SAPO NO BELMAR FIDALGO...


A primeira vez que entrei no Stadium Belmar Fidalgo, foi por puro acaso. Beirava os 13 anos, voltava de bicicleta do Dom Bosco para casa e, ao passar em frente ao portão principal do velho estádio fui atraído pelo alarido que vinha de seu interior. Era sábado. Quase 3 da tarde. Pelos gritos exaltados, logo adivinhei que os torcedores estavam brigando. Quando dei por mim estava forçando a velha catraca do portão principal. O bilheteiro e o guarda, com certeza, tinham corrido para ver a briga. Por pura molecagem, aproveitando a oportunidade, pulei a catraca. Entrei. De fininho...

Fui para a arquibancada de madeira que ficava ao lado da humilde cabine de madeira destinada à crônica esportiva. Nela, Sabino Preza, Ramão Achucarro, Mario Mendonça, Kamya Júnior, Santos Mário, continuavam a narrar o jogo. O tumulto acabara de ser controlado...

No gramado jogavam Asas X Primeiro de Maio: soldados da Aeronáutica versus empregados da Sapataria Zás-Trás. “Padeiros” contra “sapateiros”. A briga acabara. Os jogadores ainda estavam nervosos. Para fugir do porteiro, busquei abrigo na torcida do Asas, comandada por Mikiba, um taifeiro da Base Aérea, fanático, que não parava de gritar bem alto incentivando o seu time. Na outra torcida, paraguaios gritavam palavrões em guarani que eu não entendia...

O “zero”, não saía do placar. Jogo duro. Difícil. Tenso. Disputado sob uma chuva fina. Insistente. O gramado estava encharcado. A bola quase não rolava. Poças tomavam conta do campo inteiro...

Ferramenta, zelador do estádio, apitava a partida. Seus auxiliares? Felipão e Português. O trio se esforçava para não criar caso, nem com os “soldados”, nem com os “sapateiros”. Aquele empate não servia para nenhuma das equipes. Ambas poderiam ser desclassificadas. Era vencer ou vencer...

Com o ambiente quente, relógio avançando, o jogo fica dramático. Os times não arriscavam. A torcida roía as unhas. Um torcedor impaciente, chateado com aquele “cerca-lourenço”, desabafou: “Vamos correr safados! Falta só um minuto!”. O desespero tomou conta dos jogadores. O jogo pegou fogo. O medo da desclassificação se desenhava nas caras dos atletas...

Daí, o lance que viraria folclore...

O Primeiro de Maio atacou com Antolí: recebeu a bola do goleiro paraguaio Hermocilia, se livrou de um adversário, tabelou com seu irmão Sapateiro e, da entrada da área, deu uma bicuda que ia furar a rede. Alindor (“Gato”), goleiro do Asas voou baixo, desviou o petardo. A bola ricocheteou na trave, bateu em Dequinha, pipocou no Maria Gorda e sobrou para Fumaça. De olhos fechados o sargento enfermeiro deu um balão para o lado que estava virado. A bola subiu, atravessou o campo. Foi cair, limpinha, nos pés de Sapo, ponta direita do Asas que partiu em velocidade rumo ao gol adversário...

Desesperado, Hermocilia, goleiro da Zás-Trás, abandonando a meta tentou impedir que Sapo chutasse. Com rara habilidade, Sapo se livrou do obeso guarda metas e, vendo a bola se encaminhar para dentro do gol, correu, para sua torcida. Vibrava, comemorava o golaço que pensava ter feito. Acabou sendo sufocado por uma pirâmide humana. Hermocilia, caído na intermediária, cara enfiada na lama, dava murros no chão, lamentando a desclassificação do Primeiro de Maio...

Enquanto a torcida do Asas corria para o alambrado para comemorar seu gol, aconteceu uma coisa do arco da velha. Aquela festa não durou muito. De repente o carnaval foi se transformando em murmúrio. O velho Belmar ficou mudo. Enquanto um silêncio sepulcral dominava a torcida, de novo aquela voz anônima, incrédula, começou a berrar: “Olha a bola seus burros!”...

A bola? Não entrara no gol. Depois de chutada, maliciosa, matreira e coquete, estava parada. Quietinha. Descansava, na boca do gol, metade em cima da linha fatal, dentro de uma poça d’água. Imaginem vinte-e-um marmanjos, acordando do absurdo transe, disparando na mesma direção, tentando impedir (ou concretizar) o lance de misericórdia...

Benitez, zagueiro de seleção paraguaia, capitão do Primeiro de Maio, saúde de puro sangue, um armário, chegou primeiro. Sem nenhuma categoria, mas com muita picardia, deu um bico na “garotinha”. Deu um chutão para longe. Por cima do muro e das copas dos ipês coloridos da Dom Aquino. O que aconteceu depois? Uma explosão de gargalhadas...

O jogo? Acabou zero a zero, com torcedores e jogadores se abraçando...

Meninos... Eu vi !!!

******[Jair Buchara]******


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