08/09/2025

O ANÃO DO TECO-TECO...

 

O ANÃO DO TECO-TECO...

                                Jair Buchara

 Antes dos anos dourados, no início da década de 50, quando Campo Grande, MS, era só um arremedo de cidade, sempre descia no pequeno aeroporto de terra batida da Delta, no bairro Amambaí, um avião teco-teco que vinha desde São Paulo para voar até o Pantanal fazendo voos turísticos, panorâmicos. Seu piloto cobrava 15 mil réis pelo passeio. Perto do Portão de Ferro, ficava um velho circo de lona onde o piloto costumava ir para fazer higiene mental. Lá, em pouco tempo, acabou ficando amigo do palhaço, dono do circo, e de um anãozinho que fazia acrobacias no trapézio...

O palhaço era muito brincalhão, fazia pegadinhas e falava muito alto, tirando sarro das pessoas. O piloto, intimamente, o achava um chato. Toda vez que o piloto chegava ao circo, o anãozinho chamava o palhaço e, juntos, na frente do aviador ficavam implorando, dizendo que queriam voar. Só que apenas o palhaço tinha uns trocados para bancar o passeio. O anãozinho não tinha nenhuma grana e chegava até a chorar sonhando com aquela aventura. Certo dia o piloto ficou com pena dos dois e disse para o palhaço:

- Eu levo o anãozinho de graça, mas você tem que pagar e ir junto como responsável! E tem mais; você está proibido de abrir a boca durante o voo para não me distrair!

O palhaço aceitou. Jurou que ia ficar mudo...

O piloto decolou com os dois. Durante bom tempo exagerou nas manobras que sabia: de costas, ponta cabeça, parafuso, rasantes no rio Anhanduizinho. Meia hora depois, aterrissou. Pousado o avião, enquanto desembarcava, o piloto perguntou ao assustado palhaço que fora o primeiro a despencar da aeronave:

- Caramba, parabéns. Você é um cara porreta! Não deu um pio durante o voo! Pensei que não aguentaria ficar de boca fechada, quieto, sem fazer nenhuma palhaçada!...

O palhaço respondeu:

- Quer saber? Teve uma hora que quase gritei! Mas como você tinha me proibido, fiquei na minha! Não disse nada!...

O piloto, curioso, perguntou:

- Foi na hora que voei em parafuso?...

O palhaço, com os olhos marejados de lágrimas, tristemente balbuciou:

- Não. Foi quando você voou de costas. Foi na hora em que o anãozinho caiu do avião!

Meninos... Eu vi !!!

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06/09/2025

"AQUELA" MULHER...

 



 

Anos atrás, perambulando pelas ruas de São Paulo, acabei deambulando no bairro oriental da Liberdade...

No meio da sua parafernália de lojas e bares, fui atraído por uma pequena porta de um modesto bazar de antigüidades. Entrei, por entrar, seduzido mais pelo ambiente misterioso do que pela vontade de descobrir o que quer que fosse. Dentro, ninguém. Passei alguns minutos examinando peças interessantíssimas de cerâmica, pedra sabão, granito, mármore. Obras das antigas dinastias que dominaram o Oriente durante séculos. Coisas lindas. Pequenos mas lindos escrínios...

Já procurava a saída quando meus olhos viram perdido no meio de antigas louças, um vasilhame diferente de todos os outros. Uma delicada xícara... de porcelana. A fragilidade da textura, o talhe de porte nobre, a magia na mistura das cores, o encanto dos desenhos em alto e baixo relevo, a leveza do conjunto, extasiaram-me...

De repente, um ancião de longa barba branca, como por encanto, surgiu do meio das bugigangas e, aproveitando-se da minha admiração, disparou palavras que eu quase não conseguia entender. Tentando explicar o valor daquela inestimável jóia, o velho, ao expor a pequena xícara contra a luz, revelou-me um segredo. No fundo, quando a luz atravessava sua fina película de porcelana, revelava secretos desenhos, invisíveis a olho nu...

Estendeu-me a peça para que eu a pegasse. Recusei. Tive medo. Era demais valiosa. Jamais (eu não sabia o porquê) ousaria tocar naquela obra de arte. O velhote ficou sem entender nada quando, passo a passo, fui recuando, sem conseguir desviar meus olhos daquela xícara, até chegar à porta. Fugi...

Nunca mais voltei naquele lugar...

Anos mais tarde, numa noite de um dezembro qualquer, debrucei-me no parapeito do apartamento de um amigo buscando fugir do tédio em que sua festa mergulhara. Distraído, tentava descobrir porque uma estrela tinha o direito de ser mais bela e brilhar mais que as outras, quando alguém, chegando sorrateiramente, me assustou. Querendo descobrir quem acabara de chegar, girei meu corpo bruscamente. Era uma mulher...

Já a conhecia de outros dias. Já a admirava. De longe. Minha atração por ela era inconfessável, mas antes, nunca a vira tão bela. Sabia que era bonita, mas não sabia que, mesmo vestida de uma maneira mais sofisticada, podia exagerar nos seus encantos. Gaguejei algumas palavras de cumprimento. Minimizei-me diante de seu transcendente magnetismo pessoal. Sequer tive a coragem de estender minha mão para concretizar o ato. Quando ela se afastou sorrindo, sem entender a razão daquele meu comportamento, desalinhados e confusos meus pensamentos mergulharam no passado. Voltei ao bairro nipônico. Somente daí, descobri minha verdade...

“Aquela” mulher sim era uma jóia. Uma porcelana do Oriente. Tinha seu desenho exterior, mas (quando lhe convinha), sábia e sutilmente deixava transparecer alguma coisa de seu secreto e enigmático interior. Apenas o absolutamente necessário para atingir seus propósitos. Era bela, sem ser ostensiva. Era simples, sem chegar à timidez. Era incrivelmente natural, mas mesmo assim, era elegante e sedutora...

Como no caso da xícara, percebi que jamais ousaria tocá-la. Faltar-me-ia coragem. Tinha medo de fazê-la perder o seu justo equilíbrio. Quebrar aquilo que eu entendia ser a sua mais pura e irreverente magia: seu doce encanto...

A festa, para mim, acabara. Hipnotizado, receando não resistir à tentação de tocá-la, decidi que era hora de ir embora. Sabia que jamais iria esquecê-la. Recuando, sem conseguir desviar meus olhos dela, cheguei à porta. Fugi...

Nunca mais voltei a ver “aquela” mulher...

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13/08/2025

MULHER...

 


MULHER É COMO ANDORINHA...

...FICA, ENQUANTO HOUVER VERÃO...

FOGE DO FRIO, BUSCA DESESPERADAMENTE O CALOR...

NÃO LHE BASTA TER QUENTE APENAS O CORPO; PRECISA, TAMBÉM, AQUECER SEU CORAÇÃO...

O AMOR PARA A MULHER É MEIO, É FIM. TANTO QUANTO ÍNTIMO, TEM QUE SER PROPAGADO, MARCADO, GRAVADO... A FERRO E A FOGO. PRECISA CHAMAR ATENÇÃO. SER PLENO DE PALAVRAS BONITAS, DE ELOGIOS, DE INSINUAÇÕES. ELA VIBRA COM O SENTIMENTO (MESMO O PLATÔNICO) QUE A TRANSFORMA EM SANTA E A COLOCA NUM PEDESTAL...

SÓ ISSO? NÃO, NÃO BASTA. QUER MAIS. PRECISA MAIS. COMO FRUTA MADURA, PRECISA SER CHEIRADA, APALPADA, DESEJADA, COMIDA, SUGADA. PRECISA DISTO PARA MATERIALIZAR, REAFIRMAR, SUA IDENTIDADE COM SEU PRÓPRIO SEXO...

HÁ DE SER SEMPRE ASSIM!

É ANDORINHA QUE, DE REPENTE, SURGE SAÍDA SABE-SE LÁ DE QUE PERDIDA NUVEM OU DE QUE INCERTO CÉU E SEM PEDIR LICENÇA, FAZ SEU NINHO EM NOSSOS BRAÇOS. SEU TRUQUE É ESPERAR QUE A GENTE SE DISTRAIA E, POR UM SEGUNDO, VACILE, SEJA FRACO. AO PISCARMOS OS OLHOS, LÁ ESTARÁ ELA: COLADA EM NOSSO CORPO, DERRAMANDO MEL PELOS LÁBIOS, ESPARGINDO PERFUME POR TODOS OS POROS. CARENTE, CHEGA EM BUSCA DA TEPIDEZ DE NOSSO LEITO, DO CALOR DE NOSSO PEITO, DO FOGO DE NOSSO SEXO...

ASSIM É, ASSIM SEMPRE FOI!

APEGAR-SE A ELA É SE CONDENAR À NÉVOA DE UM AMANHÃ INCERTO. É JAMAIS SABER SE AO DESPERTARMOS DE NOSSAS FANTASIAS, ELA AINDA ESTARÁ AO NOSSO LADO, ROUBANDO NOSSO ESPAÇO, ASPIRANDO NOSSO AR, DEVORANDO NOSSOS CORPOS, ABSORVENDO O SABOR DE NOSSO HÁLITO. SACIADA, SARADA, SADIA, AO PRIMEIRO SINAL DE UM IMAGINÁRIO INVERNO, ABANDONA NOSSOS BRAÇOS...

FOGE, FREMINDO SUAS ASAS. BUSCA NOVO NINHO, NA LINHA DO HORIZONTE... PARA NUNCA MAIS VOLTAR...

MULHER? É ANDORINHA...

ASSIM É, ASSIM SEMPRE SERÁ!

jairbuchara@hotmail.com

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